domingo, 6 de dezembro de 2009

les cœurs et les boîtes

Era uma vez uma menina que dobrava corações de papel, e os entregava para quem queria dar seu coração. Eram corações muito carinhosos. Os primeiros que ela fez foram com folhas de caderno, e tinham uma silhueta geométrica, com ângulos pontudos que ela aprendeu a disfarçar. Depois ela treinou muito, fazendo vários corações em tamanhos e cores diferentes, colando figuras nos corações, aprendendo a dobrar papéis estampados de forma que as estampas ficassem no lugar em que elas mostrassem tudo o que ela queria mostrar.

Ela também treinou muito entregando seus corações de papel para pessoas diferentes. E ficou olhando conforme os corações foram queimados, espetados em quadros de cortiça (como borboletas numa coleção), guardados no fundo da gaveta, jogados no lixo e genericamente desprezados como se fossem dobraduras comuns. Mas não eram. Todos os corações de papel eram seu coração, e ela sentiu a perda de cada um deles.

Um dia ela cansou. Hoje dobra caixas. Pequenas caixas de papel. Caixas que protegem coisas. Caixas que ela só dá por tédio e excesso de caixas, não pela generosidade alegre e esperançosa de que alguém fique tão feliz em receber seu coração quanto ela ficava ao dá-lo. Está ficando muito boa com as caixas. Testando com diferentes papéis, em diferentes tamanhos, roubando cartões postais – daqueles de banheiro de bar – e aprendendo a fazer as estampas ficarem exatamente aonde mostram tudo o que ela quer mostrar. O quarto dela está cheio de caixas. Mas o coração dela não está em nenhuma.

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